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Biodiversidade/Sociodiversidade na Amazônia

Editor convidado
Ennio Candotti

Janeiro/Junho de 2012

Editorial

Conservar a floresta, decifrar a sua biodiversidade e promover o desenvolvimento social da região amazônica são imperativos presentes nos planos governamentais do Brasil, nas últimas décadas. Nem sempre foi assim. A Amazônia, ao longo da história, foi tratada como uma colônia em seu próprio território. Dela se extraíram – e ainda se extraem – minérios, eletricidade, e derrubaram-se – e ainda se derrubam – florestas para plantar grãos e criar gado.

Conferências, acordos internacionais e projetos nacionais desenham com novas diretrizes o desenvolvimento futuro das regiões do planeta que abrigam florestas e diversidade biológica. Apesar disso, as propostas mais recentes para a Amazônia ainda se caracterizam pela falta de clareza sobre os rumos a tomar.

Ao examinar os dois projetos elaborados pelo governo brasileiro, em 2007, o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Plano Amazônia Sustentável (PAS), pode-se identificar diretrizes divergentes que orientam as políticas de crescimento econômico do país e as políticas sociais e ambientais voltadas a promover o desenvolvimento sustentável, particularmente na Amazônia.

O PAC prevê, para os próximos dez anos, investimentos de mais de R$ 200 bilhões em obras de infraestrutura nas áreas de geração de hidreletricidade, transporte de energia, ferrovias, portos, mineração. São projetos orientados ao aproveitamento das reservas minerais, dos potenciais energéticos e dos corredores de transporte que a região oferece.

Tais investimentos e suas respectivas metas respondem, no entanto, a um projeto de crescimento do país que não tem consonância com a concepção de sustentabilidade. Os recursos naturais e os serviços ambientais, para serem aproveitados, exigiriam um projeto mais amplo do que o imaginado no PAC, incluindo, entre seus objetivos, a criação de laboratórios de pesquisa e de centros de desenvolvimento nas áreas da engenharia, saúde, biotecnologias e ciências humanas, além da formação de recursos humanos especializados.

O conhecimento científico e a competência tecnológica, imprescindíveis para promover o desenvolvimento regional, são ainda muito modestos. Não sabemos construir portos sólidos às margens de rios, cujos níveis oscilam anualmente de quinze a vinte metros. Desconhecemos a profundidade dos imensos aquíferos que se estendem no subsolo de toda a bacia e que, suspeita-se, abastecem os rios em épocas de seca. O inventário do patrimônio botânico é incipiente. O que sabemos dos microrganismos, toxinas, venenos e dos produtos naturais não é suficiente para planejar e sustentar uma exploração de longo curso.

Por outro lado, os investimentos e intervenções para explorar os potenciais hidrelétricos e minerais previstos no PAC, se fossem coerentes com os princípios subscritos pelo Brasil nas Conferências Internacionais sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável, deveriam ser acompanhados por políticas capazes de promover a efetiva melhoria da qualidade de vida das populações locais, além de propiciar a conservação do meio ambiente.

Poder-se-ia perguntar: qual a contribuição dos grandes projetos de mineração em Carajás ou da hidrelétrica de Tucuruí ou mesmo da exploração da bauxita em Trombetas para o desenvolvimento social, ambiental e econômico do Pará? Ou qual a contribuição da exploração do manganês na Serra do Navio para o Amapá?

Segundo o Plano Amazônia Sustentável, “a situação atual de ocupação desordenada com graves distorções socioeconômicas e danos ambientais, só poderá ser alterada com a adoção de um modelo de desenvolvimento efetivamente sutentável, que promova a elevação da qualidade de vida da população regional e assegure a preservação de seu inestimável patrimônio natural”.

A 44ª edição de Ciência & Ambiente é inteiramente dedicada ao presente e ao futuro da Amazônia, o que significa dizer, ao presente e ao futuro do Brasil. Contribuir para que essa concepção descrita no PAS ganhe tintas de materialidade é, portanto, um dos propósitos das importantes reflexões aqui apresentadas. Boa leitura!

Artigos

CLIMA E MEMÓRIA NA CIDADE E NA FLORESTA
Ennio Candotti

TERRITÓRIOS E TERRITORIALIDADES ESPECÍFICAS NA AMAZÔNIA
ENTRE A “PROTEÇÃO” E O “PROTECIONISMO”
Alfredo Wagner Berno de Almeida

ÁGUA SUBTERRÂNEA NA AMAZÔNIA
IMPORTÂNCIA, ESTADO ATUAL DO CONHECIMENTO E ESTRATÉGIAS DE PESQUISA
Ingo Wahnfried e Emílio Alberto Amaral Soares

ECOLOGIA DAS ÁREAS ALAGÁVEIS AMAZÔNICAS
O CONHECIMENTO SUBSIDIANDO O USO SUSTENTÁVEL
Maria Teresa Fernandez Piedade, Wolfgang J. Junk, Jochen Schöngart e Florian Wittmann

VARIABILIDADE HIDROLÓGICA MULTIESCALA NA AMAZÔNIA
MONITORANDO UMA FORTE DIVERSIDADE REGIONAL E URBANA

Naziano Pantoja Filizola Jr. e Maria Betânia Leal de Oliveira

ESTUDO COMPARATIVO DE ÍNDICES MORFOMÉTRICOS NAS BACIAS DOS RIOS JURUÁ E PURUS – REGIÃO AMAZÔNICA
Edileuza Carlos de Melo, Naziano Pantoja Filizola Jr. e Jean Loup Guyot

ANTROSSOLOS AMAZÔNICOS
UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA SOBRE AS TERRAS PRETAS DE ÍNDIO NA AMAZÔNIA CENTRAL
Bruno Moraes e Helena Pinto Lima

ECOFISIOLOGIA DE ÁRVORES DA AMAZÔNIA
José Francisco de Carvalho Gonçalves , Ulysses Moreira dos Santos Junior, Vanderlei Borboni Ferreira de Araújo e Rodrigo Pinheiro Bastos

MACROFUNGOS DA AMAZÔNIA
IMPORTÂNCIA E POTENCIALIDADES
Noemia Kazue Ishikawa, Ruby Vargas-Isla, Raquel Sousa Chaves e Tiara Sousa Cabral

O MUNDO INVISÍVEL E DESCONHECIDO DA FLORESTA AMAZÔNICA
REINO FUNGI
Sandra Zanotto, Maria Dolores Fonseca e João Lúcio Azevedo

PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL E SISTEMA AGRÍCOLA NO MÉDIO RIO NEGRO – AMAZONAS
Laure Emperaire, Lucia Hussak van Velthem e Ana Gita de Oliveira

“ROÇAS QUILOMBOLAS”
CONHECIMENTOS TRADICIONAIS E TERRITORIALIDADES ESPECÍFICAS NO MÉDIO/BAIXO RIO NEGRO

Emmanuel de Almeida Farias Júnior

A SUSTENTABILIDADE DO ARTESANATO EM FIBRAS VEGETAIS
ESTUDOS DE CASO NA AMAZÔNIA BRASILEIRA

Erika Matsuno Nakazono

O IMPACTO DA CONSOLIDAÇÃO DO POLO INDUSTRIAL DE MANAUS NAS CIDADES DO AMAZONAS
O CASO DE ITACOATIARA E PARINTINS
Tatiana Schor, Thiago Marinho e Moises Augusto Tavares Pinto